sábado, 31 de outubro de 2009

Cartão Postal

De noite, senta-se e escreve num postal tudo. Apoiado pelos cotovelos pensa em achar aquilo que lhe foi perdido, havia tomado distância grande do pequeno mal que carregava. Distância, de si mesmo. Enganou-se. A imperfeição do que lhe parecia perfeito alojou-se em seus órgãos. Rins, fígado e coração.


Amor sem fim, cruel aquele que o tem. Tão puro e doce se o ver de fora. Indigesto em meio à ânsia de um sonho inútil. Disperso sem precisão. Não era a hora! Começou sozinho aquilo que devia ser feito a dois. Egoísta incompreendido.


Não havia como se defender. Fugir para longe é comprimir o que se tem diante da face e guardar no bolso. Bastasse o que já tinha. Aos seus olhos, tudo era preto e branco. Surpresa foi ver ao longe o cinza.


Estúpido sentimento. Complexo aos seus ouvidos. Pesado para levar nas mãos. E que o fez voltar em si e muitas vezes contradizer-se. Correr desconjuntado sem trajeto. Nada saía de seus punhos. Já não podia escrever. Selou, enviando sem destinatário a lugar algum.

O desejo o consumia ao poucos. Lentamente como um veneno fatal a circular pelas veias. O ritmo da respiração embala o canto sereno da morte. Seria mais um cadáver estirado contra parede, na confusão de seus próprios sentidos. Fazia frio. Morreu de amor.

Love song for you


Entre as cores do meu quarto
Quadros e porta-retratos
E o vazio sempre me acompanha
Eu sentado ao pé da cama
Manda notícia
Me telefona
Conta como foi o seu dia.
Conta como foi mais um dia, amor.
Explica porque você me deixou
Manda embora, mate as horas
Que eu pensava em seu amor.
[...]
Fizemos.
Cindy Cardoso e Elias Gonçalves
H²O

Fogo e Vazio

(Alguns sentidos prematuros esquecidos que reprisam a memória.)






Sentado em uma fila qualquer, em uma sala clara e alienante, defronte a muitos princípios duvidosos, estou eu voando alto em busca de consolidar-me com um grande amor.

O silêncio tomava conta de minha mente. Vagava o tempo em sua rotina redundante. Algo me prende atenção. Percebo que não estou só. Há alguém ao meu lado. Ela era linda. Subitamente, remeto meu olhar em sua direção. Seus longos cabelos, seu cheiro me encantaram. Como não a vi antes? Sorrio. Em resposta, recebo um simples olhar de quem deseja estar em outro lugar.

Surpreso, abaixo a cabeça. De certo aquilo me incomodou, mais deixei de lado. Ainda sobre efeito de emoção, tentei envolver-me com aquele ser frio e seco. Sua beleza era grande, mas sua expressão era provocativa transpareciam outra pessoa. Talvez para refugiar sua solidão.

Aproximei dela e toquei suas mãos. Nesse momento, a sala fria e vazia, encheu-se de calor como a chama de uma vela. Ela me seduzia. Parecia que derramava pelo toque de seu perfume a vontade de ser minha. Meu peito latejava. Tinha necessidade de conquistá-la. Era atraído como um imã. Senti bufar de excitação.

Quando de repente, fui atirado contra a parede. Pude perceber sua respiração ofegante sobre meus ouvidos. Achei que ela correspondia minha tentação ardente em ter em meus braços, pois nasci e nunca vi uma mulher. Eu delirava. Deitamos e fizemos como primatas que se devoram rapidamente e extinguem a vontade.

Senti a penetração em seu ligamento minúsculo. Seus seios sob minhas palmas. Era moldada para encaixasse em meu corpo. Gemidos vagarosos me enlouqueciam. Só queria ficar ao seu lado. Seu corpo, seu olhar, seu coração. A vela se apagou.


Abril, 2007.

sábado, 17 de outubro de 2009

Carpos, metacarpos e dedos -Misi-èn-scene

Senhoras e senhores, respeitável público. Agora um dos dias que veio como flores, diante de todos aqueles outros que se foi com o vento. E são mais que encanto no canto de criança ou mesmo na saudação de um herói.

Diante das mãos, estão muitas faces. O que carregam? Verdades, uma centena delas. A representação suja e exposta contra luz. Minutos antes, confundem-se todos os pensamentos escusos, secreções e demais dejetos. Não há como voltar, já somos sombras de um imenso palco.

O toque minucioso ao fundo em outra língua embala para que todos se proclamem espectadores. Entre tudo que as mãos se apóiam, os dedos envolvem e as palmas asseguram.







Desconcertado

A cada dia que passa o raso torna-se profundo. E a piscina já não é mais a mesma. Entre dragões indomáveis que cospem fogo e o fogo que inflama a carne, o osso, alma humana. A decadência propõe surgir e se alojar como uma inesperada visita.

O dia insiste em ser frio acompanhado de uma chuva fina sobre o asfalto cinza. O sorriso foi desmanchado. A casa está no chão. Não houve porta que se fechasse, palavra que confortasse ou mesmo algum principio que controlasse a tortura das mãos tremulas. Faltou chão aos pés.


O herói de infância não veio. O relógio não parou e já não se pode mais atrasar as horas. A chave foi roubada. E a dama negra festeja mais uma vitima julgada a um regime injusto sem qualquer tipo de lei que revogue a sentença. Logo, todos diante da face pálida são mártires que lamentam o ocorrido. Foi o que aconteceu.

Uns Versos


Quem disse que a palavra perde-se no tempo?
Que o tempo consome memória?
Que a memória não é escrita?
Mais 365 dias.

Uns Versos

Na TV o clipe da Amy
Sob a estante aquele retrato
Amigos, meus amores
E tudo são flores!

Sou prisioneiro do itinerário
De guichê de restaurante,
De poltrona de cinema
E Sarau de Português

Um dia, cinco anos e algumas vidas passadas
O relógio já representa mais
Que a contagem cíclica do tempo
Amor não se conta.
Amor se vive
Eu vivo,
Nós vivemos.

[Outubro, 2008]